segunda-feira, 5 de outubro de 2020

Filosofia de boteco

Hoje eu me animei e resolvi dar uma arrumada na casa. Eu sei, eu sei... Nós bebemos todas ao longo desses anos por esse Rio de Janeiro de meu Deus e não compartilhamos nada aqui. Somos bem canalhas, confesso.
Nesse meio tempo entramos de penetra em festa de aniversário de desconhecido em bar (e tiramos fotos com o aniversariante!), encaramos porre da caipirinha molotov do Feio (algumas vezes) até eu chorar querendo doce e edredon (aquela caipirinha é do capeta, irmão), empurrei goela abaixo do Fabio uns petiscos de bar raiz que ele jamais experimentaria em suas andanças sem mim (moela, mocotó, rabada, etc), viciei Fabio em pimenta braba (ele inclusive me superou em resistência no quesito), descobrimos bar de churrasquinho responsa descendo em ponto final de linha de ônibus em bairro desconhecido, tomamos cerveja em pé dentro do Mercadão de Madureira (ah, que saudade de Madureira), e por aí vai. O fato é que não sabemos o que é boteco há quase 7 meses (por causa da pandemia) e talvez isso esteja me sensibilizando mais sobre o tema. Pra matar um bocado dessa saudade, me especializei na produção de acepipes que lembram nossas jornadas [quase sempre] suburbanas, acompanhados em sua totalidade por uma boa cerveja gelada. Devo dizer, entretanto, que apesar de deliciosos, a cena não está completa: falta a rua, a mesa de plástico, o copo americano meio embaçado [inclusive comprei uns pra incrementar a experiência], o cheiro do cigarro dos outros, o cachorro pedindo os ossos do frango à passarinho, os torcedores do Flamengo gritando na mesa ao lado, uma música brega tocando ao fundo, dezenas de vozes se confundindo com as nossas, os banheiros muito usados e nem sempre usáveis, o apontador do jogo do bicho sentado sozinho com um copo de café e ocupando duas mesas no bar cheio - o tipo de coisa que pode irritar frequentadores não assíduos, mas que nós, habituées, vemos como corriqueiras. E um frequentador assíduo reconhece outro, assim como reconhece os novatos. Há um modus operandi do botequeiro (não troquem as sílabas!), uma linguagem corporal específica, um vocabulário riquíssimo mas talvez não muito bem aceito nas mesas das famílias mais conservadoras. Se você é da minha geração e nunca foi repreendido com a frase "Olha como fala, você não está numa mesa de botequim", você não é botequeiro [leia devagar, rs] raiz. Outra coisa que faz falta é prestar atenção às conversas exaltadas e muitas vezes filosóficas da terceira idade que bate ponto nos botecos da vida: vira e mexe somos contemplados com pérolas de sabedoria que levamos conosco. Os caras são tipo coach de botequim, saca? Sempre têm uma lição, uma história, uma opinião sobre qualquer coisa, um significado pra tudo. Pra finalizar, vou encerrar com duas dessas pérolas que mais gosto:
"Ninguém faz amizada bebendo leite." [oh, yeah]
"Se a vida te der limões, faça uma caipirinha." [limonada é para os fracos]

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