Hoje eu me animei e resolvi dar uma arrumada na casa. Eu sei, eu sei... Nós
bebemos todas ao longo desses anos por esse Rio de Janeiro de meu Deus e não
compartilhamos nada aqui. Somos bem canalhas, confesso.
Nesse meio tempo entramos de penetra em festa de aniversário de desconhecido em
bar (e tiramos fotos com o aniversariante!), encaramos porre da caipirinha
molotov do Feio (algumas vezes) até eu chorar querendo doce e edredon (aquela
caipirinha é do capeta, irmão), empurrei goela abaixo do Fabio uns petiscos de
bar raiz que ele jamais experimentaria em suas andanças sem mim (moela, mocotó,
rabada, etc), viciei Fabio em pimenta braba (ele inclusive me superou em
resistência no quesito), descobrimos bar de churrasquinho responsa descendo em
ponto final de linha de ônibus em bairro desconhecido, tomamos cerveja em pé
dentro do Mercadão de Madureira (ah, que saudade de Madureira), e por aí vai. O
fato é que não sabemos o que é boteco há quase 7 meses (por causa da pandemia) e
talvez isso esteja me sensibilizando mais sobre o tema. Pra matar um bocado
dessa saudade, me especializei na produção de acepipes que lembram nossas
jornadas [quase sempre] suburbanas, acompanhados em sua totalidade por uma boa
cerveja gelada. Devo dizer, entretanto, que apesar de deliciosos, a cena não
está completa: falta a rua, a mesa de plástico, o copo americano meio embaçado
[inclusive comprei uns pra incrementar a experiência], o cheiro do cigarro dos
outros, o cachorro pedindo os ossos do frango à passarinho, os torcedores do
Flamengo gritando na mesa ao lado, uma música brega tocando ao fundo, dezenas de
vozes se confundindo com as nossas, os banheiros muito usados e nem sempre
usáveis, o apontador do jogo do bicho sentado sozinho com um copo de café e
ocupando duas mesas no bar cheio - o tipo de coisa que pode irritar
frequentadores não assíduos, mas que nós, habituées, vemos como
corriqueiras. E um frequentador assíduo reconhece outro, assim como reconhece os
novatos. Há um modus operandi do botequeiro (não troquem as sílabas!), uma
linguagem corporal específica, um vocabulário riquíssimo mas talvez não muito
bem aceito nas mesas das famílias mais conservadoras. Se você é da minha geração
e nunca foi repreendido com a frase "Olha como fala, você não está numa mesa de
botequim", você não é botequeiro [leia devagar, rs] raiz. Outra coisa que faz
falta é prestar atenção às conversas exaltadas e muitas vezes filosóficas da
terceira idade que bate ponto nos botecos da vida: vira e mexe somos
contemplados com pérolas de sabedoria que levamos conosco. Os caras são tipo
coach de botequim, saca? Sempre têm uma lição, uma história, uma opinião sobre
qualquer coisa, um significado pra tudo. Pra finalizar, vou encerrar com duas
dessas pérolas que mais gosto:
"Ninguém faz amizada bebendo leite." [oh, yeah]
"Se a vida te der limões, faça uma caipirinha." [limonada é para os fracos]